terça-feira, 22 de junho de 2010

Os Movimentos Sociais fazem história, por Juliana Silva

Os movimentos sociais nos países da América Latina trazem em sua trincheira de lutas as mesmas bandeiras, enfrentando cotidianamente problemas comuns como desemprego, moradia, terra, saúde e educação, só para exemplificar. Lideranças, militantes entre homens, mulheres e crianças, se dispõem a lutar por objetivos peculiares rumo a melhores condições de vida, dando um significado impar à sua atuação.

“Adorado por alguns e odiado por muitos os movimentos sociais se posicionam de forma contundente ao capitalismo e às elites locais”, é o que diz a liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Marcelo Buzetto. Ele ainda ressalta que o descontentamento das organizações na América Latina se acentua comumente, pois este sistema não tem interesse em resolver problemas básicos, como a fome e a pobreza, “o processo de desenvolvimento do capitalismo na América Latina comprovou mais uma vez que por mais indústria, ciência e tecnologia que o capitalismo possa produzir no caso do Brasil, da Venezuela, México e da Argentina, a gente percebe que mesmo com esse desenvolvimento industrial capitalista, as desigualdades continuam existindo”, afirma.

A Via Campesina e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, organizações que representam os movimentos sociais da América Latina, acusam o capitalismo latino-americano de conviver com miséria, com desigualdade, com injustiça, agravada pela concentração da propriedade da terra nas mãos de uma minoria e a exploração dos recursos naturais e das matérias primas fundamentais para o desenvolvimento industrial.

Essas organizações justificam sua atuação em decorrência da desigualdade econômica social que empurra os trabalhadores a se organizar, para o representante do MST, “a idéia de revolução social não é uma idéia que surge, muitos movimentos chegam a essa decisão de que é preciso passar por transformações econômicas, sociais e políticas porque não vêem outra opção, outra alternativa”.

Movimentos Campesinos na América Latina

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é considerado a organização de maior influência política na América Latina, protagonista da construção da CLOC, Coordenadoria Latino-Americana de Organizações do Campo e da Via Campesina, uma organização internacional, cujas pautas discutem sobre soberania alimentar, reforma agrária e as demandas que cada país tem, dentro da sua especificidade.

Buzetto explica que “o que unifica a pauta dos movimentos aqui na América Latina é a luta em defesa da soberania alimentar e da reforma agrária de forma integral”, e pontua, “que tenha como objetivo eliminar a grande propriedade rural, o latifúndio, que tenha um projeto de reforma agrária com objetivo, uma participação ativa e um controle dos trabalhadores, dos camponeses, dos povos que participam dessa luta”, conclui.

Movimentos sociais contra os Produtos Transgênicos

A bandeira pela soberania alimentar, que significa o direito de que os povos possam ter e produzir seu próprio alimento, e concomitantemente a luta contra os transgênicos aqui na America Latina são pautas que unificam. Buzetto relata que a Monsanto, empresa estadunidense, tem avançado na Argentina, no Brasil e no México, e que os movimentos camponeses, os trabalhadores rurais desses países se unificaram na luta contra a utilização de produtos e organismos geneticamente modificados, como a soja e o milho.

Buzetto questiona o papel da Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, que deveria impedir que os transgênicos fossem comercializados livremente e, ao contrário, em suas palavras, “A Embrapa acabou ajudando no desenvolvimento e nós não somos contra a pesquisa, nós somos contra a liberação, porque hoje quem controla as sementes são as grandes empresas transnacionais e, no caso brasileiro e latino-americano, nós temos condições de continuar produzindo uma serie de alimentos sem a necessidade de usar organismos geneticamente modificados”, explica.

Para as lideranças dos movimentos, os recursos naturais e a terra adquirem papel cada vez mais estratégico na luta entre as classes sociais e, por isso, as grandes empresas transnacionais, grandes corporações financeiras estadunidenses, européias, sul coreanas, japonesas tentam controlar grandes extensões de terra na América Latina.

A relação dos movimentos sociais com os governos de frente popular

A liderança do MST afirma que o governo Lula não é de frente popular e reafirma sua caracterização sobre o presidente, “no MST posso falar com tranqüilidade, no MST o governo Lula não é caracterizado como um governo de frente popular e, se fosse, pelo menos a reforma agrária avançaria com um passo um pouco mais acelerado, é bem pior do que isso”

Autonomia dos Movimentos Sociais frente aos governos

Alguns movimentos sociais no Brasil, são chamados de “braços” do governo, seja desde setores ligados a igreja até o movimento sindical. A simples menção de que essas lideranças são braços do governo têm colocado em descrédito as lutas de suas respectivas organizações. Para Buzetto esse é um desafio que os movimentos estão enfrentando, para ele “mesmo que seja caracterizado um governo como sendo um governo bastante avançado, com posições críticas, acho que a tarefa dos movimentos sociais é manter sua autonomia”.

Para Buzetto as únicas formas de fugir ao problema da cooptação e da burocratização é direcionar os movimentos e suas lideranças à construção de grandes mobilizações sociais, melhorando sua capacidade organizativa, formando uma quantidade maior de militantes e dirigentes dentro do processo de luta, construindo uma aliança entre as diversas organizações que contribuam na elaboração de um programa de transformações que possa empurrar os processos de luta adiante.

Integração Social

Diferente das várias iniciativas de integração de mercado proposto pelos países da América Latina, os movimentos sociais têm tido êxito na integração social praticada sob os parâmetros da “Aliança Bolivariana dos Povos de Nossa América” – ALBA.

Sigla e iniciativas desconhecidas no Brasil, a ALBA tem sido sinônimo de orgulho, particularmente para seus precursores Venezuela e Cuba. Segundo Luiz Bassegio, Coordenador Continental do Grito dos Excluídos, a parceria foi perfeita. Cuba facilita a formação de médicos e envia profissionais para a parceira, e a Venezuela, por sua vez, fornece petróleo barato para a ilha de Fidel.

Já no Brasil a atuação dos movimentos sociais anda a passos lentos, é o que afirma Buzetto, "na nossa avaliação os movimentos sociais ainda engatinham na construção do conselho da Alba”. Preocupado com o processo de envolvimento do Brasil na ALBA, o líder do MST pondera que os movimentos no país têm pautas corporativas, bem como a jornada de luta, mas ressalva que a orientação é que todas as lideranças dos movimentos sociais na América Latina se desdobrem na construção de um espaço nacional, onde reúnam movimentos que queiram ajudar na construção do conselho de movimentos sociais da Alba.

A integração dos países latinos não pode se limitar apenas ao mercado, para as lideranças é necessário que ela atenda às demandas dos povos latino-americanos, Buzetto questiona o modelo vigente e chama a atenção dos governantes, “os países da Alba questionam desenvolvimento, integração, tudo bem, mas não a qualquer custo”, afirma.

Caminhos estreitos da ALBA no Brasil

No Brasil já existe uma coordenadoria de movimentos sociais da Alba, que começou a ser formada há três anos. Essa coordenadoria iniciou sua participação em algumas reuniões com organizações de movimento popular, sindical, do campo e da cidade. Dentre estes estão dirigentes e militantes da CUT, da CTB, da Intersindical enquanto representação do movimento sindical. Já do movimento popular há a Via Campesina Brasil, o MST, o MPA, a CPT, Pastoral da Juventude Rural, movimentos urbanos como Movimento de Trabalhadores Desempregados, e vários movimentos de Sem Teto.

Após o terremoto no Haiti, país que já vivia submerso na pobreza extrema, alcançou o ápice da desgraça. Com intuito de ajudar a população haitiana, num ato de solidariedade, os movimentos sociais do Brasil que compõe a Aliança Bolivariana dos Povos de Nossa América – a ALBA, criou uma brigada de 85 militantes com qualificação médica, engenheiros, agrônomos, entre outros profissionais e enviaram para o Haiti.

Buzetto explicou que a maior parte desta brigada é formada por técnicos agrícolas pra ajudar a desenvolver projetos de oficinas de horta comunitária, organizar produção de subsistência no interior do Haiti, pois com o terremoto há uma migração para campo, “agora que é um momento favorável de levar a bandeira da reforma agrária pro Haiti”, completa.

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